fulminato [1]

trecho do longo poema que abre o segundo volume do livro inédito no Brasil Supostos e Supliciados (1947) de Antonin Artaud.

primeiro autorretrato Antonin Artaud 1946 Rodez


Suppôts et Suppliciations
Interjections
Antonin Artaud
tradução Ana Kiffer

Maloussi toumi
Tapajouts hermafrot.
Emajouts pamafrot
Toupi pissarot
Rapajouts erkampfti

Não é o moer da linguagem mas a pulverização arriscada do corpo pelos ignorantes que

Lokalu durgarane
Lokarane alenin tapenim
Anempfti
Dur geluze
Re geluze
Re geluze
Tagure
Rigolure tsipi

Nenhuma outra orgia do espírito explicaria a constituição das coisas,
As coisas não existem,
Elas não têm constituição.
È o peido de gases eróticos no lugar onde isso cai morto.
Do corpo pelo corpo com o corpo desde o corpo e até o corpo.
A vida a alma nascem depois. Elas não nascerão mais
Entre o corpo e o corpo não há nada
O corpo se faz atrás dele mesmo e não na frente
No cortar acrescentar-...paladar,
Muito menos do que o inerte nada
Que o ultrapassa
E a santa besta inteligente de deus disse:
E eu sou uma boa besta diante de todo esse corpo
De Antonin Artaud
E não do homem:
Antonin Artaud
Que não ocupa senão uma pequena parte e que partirá
Encontrarei na hora de sua morte sem frases, sob a dor que o pré-julguei
Um meio de ressurgir em seu coração, eliminando
Aí o homem, inalando-o
Como Iavé na sua pesada Bíblia
Depois de ter encaralhado, gloteado, limado, e encrapulado

Ora, fui eu mesmo quem o evoquei uma vez mais como problema-
- do outro que jamais fui
- eu suportarei mais que isso de você
Diz o ser de espírito maléfico em face de cada uma das minhas tentativas.
E em cada uma delas me sinto, com efeito, paralisado
O parasita deus está sobre mim e me segue
Me segue em todos os lugares onde minha vida supura.
Ora, o bastão do alho-poró sem profundidade intelectual
Ou psíquica, não é suficiente,
Ele é um alho-poró verdadeiro e não psíquico
E se é isso é porque é feito de minha própria mão
Um corpo,

Sem espírito
Sem alma
Sem coração
Sem família
Sem família de seres
Sem legiões
Sem confrarias
Sem participação
Sem comunhão de santos
Sem anjos
Sem seres
Sem dialética
Sem lógica
Sem silogística
Sem ontologia
Sem regra
Sem regulamento
Sem lei
Sem universo
Sem concepção
Sem noção
Sem conceitos
Sem afetos
Sem língua
Sem úvula
Sem glote
Sem glândulas
Sem corpo tireóide
Sem órgãos
Sem nervos
Sem veias
Sem osso
Sem limão
Sem cérebro
Sem moela

Sem sexualidade
Sem cristo
sem cruz
sem túmulo
sem ressurreição
sem morte


sem inconsciente
sem subconsciente
sem sono
sem sonhos
sem raças
sem gênero
macho ou fêmea
sem faculdades
sem princípios
sem atributos
sem atos
sem feitos.

Sem futuro
Sem infinito
Sem eternidade
Sem problema
Sem questão
Sem solução
Sem cosmos
Sem gênese

Sem crenças
Sem fé
Sem idéia
Sem unidade.

Sem anarquia
Sem burguesia
Sem partidos
Sem classes
Sem revolução
Sem comunismo

A Revolução,
A anarquia
A noite
A logomaquia

Loketenor du
Bezu bubela
Orbubela
Topeltra

Sem análise
Sem síntese
Sem dentro
Sem reservas
Sem exsudato

Sem suor
Sem inspirar
Sem suspirar
Sem zona
Sem irradiação
Sem fisiologia
Sem classes
Sem luta de classes

A Revolução

Sem organismo
Sem psicologia

Tudo vindo do comando orgânico imediato de cada fulgurante instante, desde o exterior o mais banal, o mais liso
O mais bobo, o mais simples

Sem discernimento
Sem linha de frente
Sem classe
Sem sociedade
Sem qualidade
Sem virtude
Sem vício
Sem honra
Sem pecado.

Sem valor
Sem amor
Sem ódio
Sem sentimentos.

CORPO

Sem medo,
Sem impressões.

CORPO

E golpes
Golpes,
Golpes, golpes, golpes
E isso:

ESSA RESSUMA,

A murallha
Da
Crueldade
E da dor.

Me lembrarei sempre de minha vida sobre a terra, e que não é preciso se sustentar nesse compacto e opaco de uma multiplicidade azaradamente reunida.

Sem descolamento
Sem aderência

Sem mundo
Sem criação

Eu, Antonin Artaud,
Homem da terra,
Cabe a mim
Decidir
Agora
a alqueive
da talha,
da talhada
do sangue crema
que meu corpo
no devir
será.


(...).







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